Quando decidi criar este blog, a intenção era escrever sobre temas que tocam a alma (sem procrastinação).
Nos últimos anos, consumi muito conteúdo legal e divertido, mas que muitas vezes não me eram nada úteis. Percebi que esse vício me afastou de hobbies que sempre gostei, como escrever, ler e passear por aí, preferencialmente visitando parques e cafezinhos.
Pode parecer bobeira, mas essas pequenas coisas alimentam a minha alma e me ajudam a viver nesse mundo caótico sem surtar. O abandono dessas atividades me deixou mais triste, mais desanimada e mais vazia.
Então, eu decidi alimentar um pouco a minha alma — termo que aprendi ao assistir horas de lives de um psicólogo estadunidense especialista em traumas. Só que… Alguns problemas, oriundos desses mesmos traumas, apareceram à medida que eu entrava novamente em contato com meus hobbies criativos.
“Não importa”: uma profecia autorrealizadora
Escrever, para mim, sempre foi muito mais fácil do que qualquer outro tipo de comunicação. É a única forma de expressão que me permite ficar 100% confortável comigo mesma e com os outros. E, por isso, escrever sempre foi meio assustador.
Ao longo dos meus 30 anos, dediquei muito da minha vida para agradar os outros, para fazer tudo certo na esperança de não receber críticas, para evitar dar motivos para ser abandonada. Ah, o velho e clichê trauma de abandono, né?
Deste modo de pensar extremamente ridículo surgiu uma das minhas principais crenças pessoais: não importa.
“Não importa se eu não conseguir o que eu quero. A vida continua.”
“Não importa se eu não iniciar aquele projeto pessoal que tanto almejo. A vida continua.”
“Não importa se eu não for chamada para X ou Y evento. A vida continua.”
“Não importa se eu não receber X ou Y resposta de tal pessoa, ou empresa. A vida continua.”
O que parecia ser uma forma positiva de continuar sempre em frente perante as dificuldades da vida era, na verdade, uma maneira de sufocar desejos, sonhos e emoções. Toda vez que repetia frases como essas, eu estava dizendo para mim mesma, “o que você quer não tem importância. Você não tem importância”.
Foi assim que abandonei todos os meus projetos pessoais. Afinal de contas, não importa.
Com o trabalho, com a faculdade, com a escola, sempre fui muito certinha. Quando firmo um compromisso com alguém, faço de tudo para honrar, mesmo que, nos últimos anos de saúde mental precária, tenha falhado nisso ocasionalmente. Mesmo assim, tento compensar.
Maaas… Quando algo é para mim, é íntimo, é agradável, é significativo somente para mim, eu não tenho a mesma dedicação.
Prazer, meu nome é procrastinação!
O meu primeiro instinto quando o assunto é criar ou, pior ainda, continuar algum projeto pessoal é procrastinar. Quanto mais eu quero, mais eu procrastino.
É claro que o perfeccionismo também desempenha um papel importante aí. Como sei que dificilmente a realidade será como o produto final idealizado na minha mente, abandono tudo antes que qualquer forma possa ser tomada.
(Anos de terapia depois, descobri que muito disso tem a ver com a minha necessidade de mostrar apenas o melhor para os outros. Erros e resultados negativos não trazem validação, apenas reprovação.)
A procrastinação, no entanto, é o que costuma prevalecer.
Foram duas semanas para tentar escrever o segundo post. Esta nem sequer era a minha ideia inicial, mas senti a necessidade de explorar a minha falta de familiaridade com o processo… e fazer as pazes com ele.
Muitos dos mecanismos de defesa que desenvolvemos na infância e adolescência para navegar pela vida — seja familiar, escolar, social, etc — não fazem sentido na vida adulta.
Primeiramente, foram desenvolvidos por uma criança e/ou jovem ainda em fase de crescimento. Ou seja, sem o alcance emocional e a maturidade necessários para estabelecer hábitos, crenças e comportamentos saudáveis (ou lógicos).
Em algum momento da minha vida, escolher a procrastinação era uma forma de me proteger.
Se eu não fizesse nada, nunca receberia um olhar reprovador ou uma crítica pouco construtiva, não é mesmo? Já se eu deixasse para o último minuto, sempre teria uma desculpa para o resultado capenga. E, caso tudo corresse bem, como costumava acontecer, seria lucro.
O problema é que, ao tomar essa decisão, eu também escolhi ignorar críticas construtivas e conselhos de amigos, os quais poderiam ser muito úteis para o processo.
Fazendo as pazes com o processo
Procrastinação com pitadas de perfeccionismo e medo das críticas e acompanhada por uma necessidade quase inabalável de agradar os outros e negligenciar a mim mesma.
É um diagnóstico e tanto, né?
Ressalto que somente fui capaz de autoanalisar os caminhos sinuosos e, muitas vezes, irracionais que levaram à construção das minhas crenças após seis anos de terapia. Além disso, sempre tive gosto por me questionar e me avaliar.
Mas, vamos para o que é realmente importante aqui: fazer as pazes com o processo (de criação).
Saber de algo racionalmente não costuma facilitar muito a prática. Isso porque somos criaturas de hábito. É mais fácil para o nosso cérebro seguir o mesmo caminho que sempre seguiu do que tentar criar um caminho novo.
Logo, saber que perfeccionismo não ajuda em nada, que preciso ter paciência para ver a minha criação ganhar forma, que tenho que ser persistente diante de erros, que a procrastinação é um dos meus piores inimigos, que posso mudar de ideia a qualquer momento e blá, blá blá… Nunca me ajudou a superar o medo e o estresse de viver o processo.
Até agora, pelo menos.
Estou cansada de abandonar ou nem sequer começar projetos importantes para mim. Estou cansada de esperar pelas críticas e validações de terceiros, quem muitas vezes são apenas pessoas sem rosto ou comentaristas anônimos de internet. Estou cansada de não pensar em mim, de dizer a mim mesma que não sou importante.
Decidi, então, criar algumas regras.
1. Usar o bullet journal para me organizar
O período em que usei (e decorei) um bullet journal para estabelecer e cumprir metas foi o mais produtivo da minha vida. Por isso, resolvi voltar a usar esse método de organização, que é bem parecido com uma agenda, mas que convida a criatividade.
2. Fazer algo todos os dias
Mesmo que o resultado não seja idêntico ao idealizado, mesmo que não seja possível fazer muito devido à rotina corrida, mesmo que não seja nada ideal, me comprometo a fazer algo diariamente para movimentar os meus projetos.
3. Abandonar expectativas
Para seguir a sabedoria popular do “antes feito que perfeito”, abandonei as expectativas. Quero aprender como funciona o processo criativo livre de pressões — minhas e de terceiros conhecidos e hipotéticos. Assim, acredito que conseguirei diminuir a ansiedade da procrastinação.
4. Tratar tudo como um aprendizado
Aprendi a procrastinar, a abandonar e a ser perfeccionista. Então, agora, preciso aprender a criar e a ser persistente. Aos 30 anos, aprendi que muitas vezes precisamos olhar para a criança de outrora e ser os nossos próprios pais para nos ensinar novas lições de vida. Só assim conseguimos abandonar as lições negativas que cultivamos desde crianças.
Então, é isso…
Você pode julgar todo esse longo desabafo como dramático, desnecessário, fraco ou qualquer outra coisa.
E tudo bem.
O que aprendi, ao desvendar os meus próprios traumas e crenças nos últimos anos, que somos marcados por coisas pequeninas — palavras sem a intenção de magoar, olhares sem a intenção de carregar mensagens, atitudes sem a intenção de influenciar, situações sem a intenção de passar uma lição.
Sem perceber, desenvolvemos inseguranças, medos e ansiedades acerca das coisas mais “bobas”, como um post de um blog entre milhões de outros blogs internet afora.
Mas não precisa ser assim para sempre.
São coisas igualmente pequeninas que, aos poucos, nos reerguem.